REFORMA POLÍTICA OU CONSTITUINTE ?
Antes da eclosão da atual crise política que expõe as escaras do sistema político e institucional frente à opinião pública, que assiste aturdida as CPIs do Mensalão, dos Bingos e dos Correios, já tramitava no Congresso Nacional, por iniciativa do governo, a chamada reforma política. O PL 2679/03, em linhas gerais, pretende regular a pesquisa eleitoral, o voto de legenda em listas partidária pré-ordenadas, a propaganda eleitoral, o financiamento das campanhas e as coligações partidárias. Ora, ninguém discorda que realmente é necessária uma profunda remodelação no sistema partidário. No entanto, certamente, ninguém discordará também que sob a égide da Constituição de 1988 nunca se fizeram tantas reformas que levaram a este beco institucional sem saída que hoje vivemos. O processo de reforma, que foi feita de forma inconstitucional, conforme confissão do atentado à Constituição, relatado pelo ex-Presidente da Câmara dos Deputados Dr. Michel Temmer, em artigo publicado na Folha de São Paulo em 02.11.1997, criou este mostrengo jurídico onde o político sobrelevou o jurídico. Com a implantação do processo de reeleição que rompeu com um bloco de constitucionalidade de cem anos, quebrou-se da mesma forma a separação formal de poderes, porque o Presidente do momento, FHC, ficou indicando pelo período de oito anos, Ministros para o Supremo Tribunal Federal, chave da cúpula constitucional. Ocorreu assim o processo de corrosão tão bem descrito por Michel Henry Fabre, Decano da Faculdade de Direito de Aix en Provence, o efeito dos vasos comunicantes entre as funções do Poder. O Sistema de Ballottage, duplo turno francês, que veio para o bem, criou a sua vez, para o mal, uma distorção através do processo de coligações, ocorrendo assim uma fusão do sistema partidário através da criação de uma maioria que se tornou, através da morte das ideologias e por força do fenômeno, em uma imensa geléia fisiológica dentro do Congresso Nacional, que, perfeitamente afinada com o Executivo, passou a indicar, de forma hegemônica, os Juízes da Suprema Corte. Mais grave ainda a adulteração do processo legislativo pois se analogamente a sentença de um juiz peitado seria nula da mesma forma e em razão direta todas as leis, feitas por um Congresso peitado, também são atos írritos. Sabemos agora, com o escândalo do Mensalão, que este processo de corrosão não foi tão somente ocasionado por uma adulteração acadêmica nos cheks and controls (freios e contrapesos) mas pela compra literal dos votos da oposição, através de um processo de corrupção que atualmente se desvenda perante a nação estarrecida. O regime, que se tem por democrático e que combate os desvios da ditadura militar, de forma hegemônica, é tão ou mais hediondo do que aquele porque de forma sofisticada e hipócrita, sem a percepção da cidadania, cassa literalmente a representação política, através da distorção constitucional do art.45 § 1º que analogamente, cotejado com a antiga política do café com leite, hoje, através desta distorção odiosa, estabelece a política hegemônica do vatapá com girimum transferindo para o Norte e o Nordeste o poder político da federação. Nunca jamais, de forma tão sofisticada e imperceptível aos incautos, concentrou-se tanto poder configurando uma verdadeira ditadura civil. A única forma de renovação, que não revista o cansaço dos jargões próprios do proselitismo de mudança, é aquela preconizada pelo saudoso jus-publicista Leônidas Xausa, uma Constituinte exclusiva não-congressual, com candidatos avulsos, longe das oligarquias e corrupção encapsuladas na conformação dos atuais partidos políticos.