NOVA LEI DO IMPEACHMENT: A INSTALAÇÃO DA CONFLAGRAÇÃO CONSTANTE DE “NARRATIVAS”!!
O Projeto de Lei 1388/2023 de autoria do senador Rodrigo Pacheco que foi objeto de audiências públicas onde participou ex-ministro do STF, Ricardo Lewandowski, tem o objetivo maior de substituir a lei 1079/1950 que atualmente regula o processo de Impeachment no Brasil. Realmente este projeto readapta o ordenamento jurídico a estar em consonância com a Constituição de 1988 visto que a lei 1079 foi feita sob a égide da Constituição de 1946. Sob vários aspectos o Projeto de Lei simplifica e dá metodologia sistemática a tipificação dos crimes constantes naquela lei ampliando o seu substrato fático e sua incidência para fatos novos que, recentemente, na guerra de “narrativas” ameaçaram a ordem jurídica constitucional. Da mesma forma, além de ampliar para melhor a incidência de suportes fáticos da lei ela amplia o leque de autoridades sujeita a este remédio constitucional heroico. Como antigo professor de Direito Constitucional ao longo de 35 anos de exercício do Magistério Jurídico, atualmente aposentado, e com longa prática e experiência no processo de impeachment fiquei satisfeito e ao mesmo tempo insatisfeito ou deveras apreensivo com a possível edição e consequente aprovação desta nova lei. Sob o aspecto da metodologia de abordagem da Lei sob o princípio federativo e das autoridades atingidas, com sua ampliação e o correspondente e específico procedimento processual atinente a Lei é muito mais metódica que antes pois a anterior tinha como se fosse duas partes, uma referente a compilação e enumeração dos crimes e, outra, referente a sua aplicação as diversas autoridades e da mesma forma a indicação das jurisdições respectivas. No entanto, com respeito ao seu recebimento, tanto na Câmara, como no Senado, que se faz através de seus respectivos presidentes no que concerne as idiossincrasias correspondentes às diversas autoridades, o Projeto Novo, somente estabelece um prazo para que estas autoridades procedam no recebimento ou não da ação. Fiquei aturdido pois a impressão que se tem, num primeiro momento, quando se desconhece o Direito Constitucional, é a impressão de celeridade e compromisso com a obtenção do fim a que pretende o procedimento mas, no entanto, para àqueles que conhecem a substância do Direito Constitucional, continua o impasse intransponível de Cassação do Princípio Democrático e de seu processo intrínseco de Contraditório e de Representação Processual e de Órgãos, pois conforme já argumentei na prática diuturna de vários Impeachments e Mandados de Segurança contra ambas autoridades, Presidente do Senado e Câmara, eles não detém a representação substancial do Povo Soberano, tanto no Senado e Câmara, conforme as teorias organicistas esposadas por Gerber, Gierke e seu grande caudatário nacional, Pontes de Miranda, que expressamente manda que ambas as Casas do Congresso, no despacho de recebimento ou não da Ação de Impeachment sejam representadas por uma Comissão Paritária e Proporcional dos Partidos com assento nas casas do Congresso. Ambas autoridades, os Presidentes do Senado e Câmara, atualmente conforme praxe distorcida contra o princípio de representação popular, é dizer contra a Democracia, denegam ou aprovam o recebimento ao seu inteiro alvedrio desposando as teses mais esdrúxulas que se expressam através até de frases similares e com efeitos semelhantes ao popular “vá catar coquinhos ali na esquina!!”. O mais temerário nesta época de politização total ou do conflito de versões ideológicas ou as chamadas “narrativas” é a ampliação das autoridades atingidas para o quadro de Juízes de carreira e membros do Ministério Público. Sim!! Se fosse em outras épocas e noutro tipo de clima eu seria o primeiro a aprovar e aquiescer com este tipo de verdadeira democratização do instituto pois seria alargado historicamente na mesma medida de seu similar nos Estados Unidos, onde a Constituição de 1787 e suas emendas, já regulava esta possibilidade quando, pela influência de Rui Barbosa, na Constituição de 1891, foi transplantado o instituto para o constitucionalismo brasileiro e daí em diante seguiu no Bloco Constitucional Brasileiro fazendo parte das Constituições de 1946, 1967, 1969 e 1988. O argumento de que os juízes aqui no Brasil não são eleitos e sim recebem a Soberania pelo condão do exercício da Jurisdição através de concursos públicos ou por fazerem parte dos quintos constitucionais do MP e da Advocacia. No entanto, se esta argumentação, no passado, era uma ampliação da liberdade e das garantias da cidadania e por isto mesmo da Democracia, hoje, num estado onde vige um verdadeiro “Inferno Constitucional” decorrente do processo de reeleições deflagrado pela Emenda 16 de 04.06.1997, em que os Ministros das Cortes Superiores dos Tribunais foram indicados reiteradamente, em razão de reeleições permitidas, ocasionando um processo de travamento dos Checks and Controls ou Freios e Contrapesos, pois a real Separação de Poderes, prelecionada por Montesquieu, por conta das indicações de Juízes com afinidade política ou com o Presidente ou com a maioria Congressual, faz e ocasiona, inevitavelmente, a fusão das três funções num processo similar ao que ocorria na URSSS onde o regime de partido único ocupava o Executivo, o Legislativo e também o Judiciário, sendo a separação de Poderes uma mera ficção própria para enganar tolos ou estultos, que não tem acuidade de percepção para perceberem um sofisma ou uma mera prestidigitação de aparências que ofende a inteligência de qualquer um pois se um mesmo pensar e um mesmo partido ou ideologia está e ocupa todas as funções não há divisão mas sim identidade de pensar que elimina o contraditório e a diversidade e seu inerente aforisma contido no “epluribus unum!” Mesmo que o discurso preponderante exercido pelo lado que eventualmente ganhe as eleições imponha a obviedade de sua versão ou “narrativa”! O pior em tudo isto, que deflui à um idoso experiente no exercício prático e empírico do processo de impeachment é que mesmo que se superasse ou se suprimisse os argumentos do “conluio de funções de poderes” ou o da argumentação da não eleição aqui dos juízes e promotores teríamos ainda um verdadeiro óbice à ser suplantado e vencido que seria aquele que se refere se não ao “inferno constitucional que vivemos” seria, repito, à argumentação que se refere a obtenção da paz social, da segurança jurídica e da harmonia dos vários segmentos que vivem sob o manto da soberania da lei. Sim pois a história está cheia de relatos que nos mostram a prática diuturna dos extremos ideológicos políticos que visam erradicar e suplantar a diversidade, própria da Democracia, para implantar, ou por ideologias de esquerda ou de direita, v.g. revolução bolchevique na Rússia ou golpe nazista na Alemanha, a hegemonia de uma pensamento único, de um poder único, que retira e erradica o poder de debate, discussão e convívio das diversidades dentro das atmosferas dos estados que se tornam de democratas em opressores ou pela via esquerdista ou pela via direitista! É o império das narrativas que se conflagram até a eliminação total de uma ou outra versão com o predomínio exclusivo de monopólio e onipotência de uma ordem tirânica e totalitária que interfere nos costumes, pensamentos, condutas e práticas da cidadania privada eliminando os direitos e garantias individuais e extinguindo com àquela Zona de Exclusão demarcada por estes direitos fundamentais do ser humano, que discordando da ordem constituída é enviado a Gulags ou Campos de Concentração e eliminado de várias formas como a história testemunha. Ora, argumentarão alguns adoradores da mágica da linguagem que não percebem a ambiguidade da linguagem já detectada na antiguidade por Aristóteles e Platão e vários filósofos da modernidade e pós-modernidade como Martin Heideggher ou Hans Georg Gadamer que salientam os exercícios de retórica e a não denotatividade dos vocábulos e termos mas sua ambiguidade e conotatividade que são amenizadas e amainadas pela civilização através do processo de Hermenêutica Jurídica, da Interpretação em suas várias modalidades! Assim é que aqueles que amam a “edição de leis perfeitas e justas” não concebem preventivamente a celeuma interpretativa que elas geram, sendo estas celeumas agravadas pelo embate ideológico das várias versões ideológicas ou “narrativas” extremadas que buscam através da luta política a sua proeminência e vigência futura com toda a onipotência de mera crença em verdades que se distanciam da Diversidade e da Multiplicidade contida no Arké (ordem) ideológica da Democracia que é representada, da melhor forma, pela iridescência do Arco Iris que mostra a diversidade do Espectro Ideológico da Humanidade através da escolha de múltiplos caminhos e portas para o encontro da variegada Felicidade Humana. Pior em tudo isto é que na vigência atual do dito “Inferno Constitucional” somado a conflagração das versões de “narrativas” sejam de esquerda ou direita, todos os nominados como titulares “ad causam” da ação de Impeachment, inclusive partidos, todos, independentemente do julgamento final que lhes atribua ou no final, desatribua direito à ação, todos têm direito a entrar com a ação criando assim, inicialmente, um turbilhão de ações que impugnariam vários órgãos judicantes por não estarem à contento de suas versões ou “narrativas” ideológicas seja de esquerda ou direita. A Justiça é feita através de processos e procedimentos em que mesmo os mais informais que estimulam a mediação e arbitragem sempre são demorados e Justiça que tarda é Injustiça levando assim todo este processo de inclusão de Juízes Togados e Promotores, como alvos de processos de impeachment, a um conflito disseminado no espaço das teses antagônicas levando a implosão da ordem, da harmonia, da paz social e da segurança jurídica que se perderia na eternização do conflito transformando o jurídico no mais bastardo proselitismo e império do político!!! Seria a implosão da fábula jurídica transformada em mito da segurança jurídica alicerçada na premissa de “que havia ainda juízes em Berlim!”