OS POLÍTICOS E A REPRESENTAÇÃO POLÍTICA E A MUDANÇA ESTRUTURAL DA ESFERA PÚBLICA – REFORMAS POLÍTICA, ELEITORAL E PARTIDÁRIA JÁ!
Jürguen Habermas escreveu uma das mais emblemáticas obras do século XX em 1961: Mudança Estrutural da Esfera Pública. Ali ele demonstra a evolução mutante e as relações do público e do privado, desde a remota antiguidade, passando pelo medievo, pela renascença até a modernidade. Habermas detalha a alteração dos costumes e das relações entre público e privado mostrando que as alterações sociológicas são causadas por mudanças de hábitos e costumes como, v.g., o consumo do café, do chá e da cerveja, que criaram cafés e cervejarias, onde a política e mesmo os negócios e bolsas de valores se efetivavam. Esta obra foi traduzida do alemão para o português por Fl[ávio R. Kothe e publicada pela editora Biblioteca Tempo Universitário em 1984. Da mesma forma Pierre Lévy escreveu sua obra O QUE É O VIRTUAL que, adicionada ou sobreposta em franca retroalimentação à obra de Habermas traz ilações e impactos importantíssimos neste começo do século XXI a área da representação política. Pierre Lévy no capítulo que trata das Sociedads Pensantes expressa objetivamente que na realidade “a verdade é que a inteligência é fractal, ou seja, se reproduz de maneira comparável em diferentes escalas de grandeza: macro-sociedades, psiquismos transindividuais de pequenos grupos, indivíduos, módulos infra-individuais (zonas do cérebro, “complexos” inconscientes), agenciamentos transversais entre módulos infra-individuais de pessoas diferentes (relações sexuais, neuroses complementares). Cada nó um zona do hipercórtex coletivo contém por sua vez um psiquismo vivo, uma espécie de hipertexto dinâmico atravessado de tensões e de energias atingidas de qualidades afetivas, animadas de tropismos, agitadas de conflitos…em contrapartida, há uma qualidade difundida em diversos graus em todos os tipos de espíritos mas que as sociedads humanas ( e não mais os indivíduos) exemplificam melhor que as outras: a de refletir o todo do espírito coletivo, cada vez diferentemente, em cada uma de suas partes. Os sistemas inteligentes são “holográficos” e os grupos humanos são os mais holográficos dos sistemas inteligentes. Como as mônadas de Leibniz ou as ocasiões atuais de Whitehead, as pessoas encarnam, cada uma delas, uma seleção, uma visão particulares do mundo comum ou do psiquismo global.”[1] A mudança paradigmática e que absorve a continuidade do pensamento harbesiano é a mudança da esfera pública que se faz através do fenômeno ou efeito que Piérre Levy cognomina como “efeito MOEBIUS” que ele qualifica como “além da desterritorialização, um outro caráter é frequentemente associado à virtualização: a passagem do interior ao exterior e do exterior ao interior. Esse “efeito Moebius” declina-se em vários registros: o das relações entre privado e público, próprio e comum, subjetivo e objetivo, mapa e território, autor e leitor, etc. ..as coisas só tem limites claros no real. A virtualização, passagem à problemática, deslocamento do ser para a questão, é algo que necessariamente põe em causa a identidade clássica, pensamento apoiado em definições, determinações, exclusões, inclusões e terceiros excluídos. Por isso a virtualização é sempre heterogênese, devir outro, processo de acolhimento da lateralidade. Convém evidentemente não confundir a heterogênese com seu contrário próximo e ameaçador, sua pior inimiga, a alienação, que eu caracterizaria como reificação, redução à coisa, ao “real”.” Assim é que este fenômeno percebido por Habermas e Pierry Lévy em suas obras causa uma mudança e um impacto que se traduz nos fenômenos que temos vivenciado no século XXI, antes de 2013, na Europa e no Norte da África, onde a guerra da Síria é onde a ditadura e a regulação, apoiada pela Rússia, ainda resiste à desregulação que atingiu o Egito com sua praça Thahir, a Catalunha, a Líbia de Kadafi e que está atingindo a Social Democracia Européia, primeiro nos Pigs, Portugal, Itália, Espanha e Grécia, com suas fraquezas econômicas – são produtores de produtos com pouca agregação tecnológica – ante a globalização ou concentração das Transnacionais Corporations que investem todo o seu capital nos 800 milhões de chineses – MÃO DE Obra ALTAMENTE BARATA – desregulando mercados através de uma competitividade causada pelo dumping social e monetário, à cavalo de uma MAIS VALIA nunca jamais vista, transferindo capitais, investimentos e fluxos para a Ásia e saqueando e desestabilizando os regimes do DEVE SER JURÍDICO, seja, o Comunismo e que resta do mesmo e a Social Democracia ainda existente na Europa e na América Latina, levando junto os regimes regulados ou chamadas tiranias e ditaduras cujas fronteiras se dissolvem a mobilidade das redes sociais e da construção do EU NO ENTRE SI como caracteriza Pierre Lévy. Assim é que as imagens digitalizadas acabam com o xerox; acabam com as máquinas e as fotos com películas químicas; a maquina de escrever vai para o saco de lixo da história, o livro vive o seu canto de cisne; os jornais impressos são ameaçados e estão também nos seus últimos dias transformando-se em virtuais; o Uber desregula os cartórios de concessões estatais para taxis; o comércio virtual vai abolindo pouco a pouco as lojas reais com seu custo mais baixo e que emprega o sistema just and time com a administração zero de estoques e almoxarifados que são gradativamente extintos pelo seu alto custo sendo substituídos pela logística fábrica direto ao consumidor; até mesmo a mais velha das profissões, a prostituição e suas “zonas”, sofrem o impacto da mudança de costumes com a liberalização e a concatenação das necessidades diretas através de mecanismos virtuais de aproximação, como o Tinder e TWO que liberam e facilitam as apresentações virtuais sem contar com Linkendin, TWeter e Facebook e outros que dinamizam as relações desenterrando velhos conhecidos, parentes longínquos ou desaparecidos nas distâncias para torna-los atuais e atuantes em nosso dia a dia povoando nossa vida com virtuais e inúmeros “amigos” que , teoricamente, extinguem a solidão humana com o simples ligar e apertar de um botão. Assim é que os comícios que são originários das Comitia Curiata e Comitia Centuriata, respectivamente agregações Civis Familiares e Militares, da antiguidade romana, extinguem-se com o surgimento do rádio, da televisão e são trocados pelo discurso ou comício eletrônico, este mesmo comício eletrônico, pela ausência total de ALTERALIDADE NOW e AGORA também falecem e são trocados, substituídos pela ALTERALIDADE TOTAL DA REDE SOCIAL que impacta sobremaneira sobre a REPRESENTAÇÃO POLÍTICA que foi uma das formas de sobrevivência que vicejou sobre as representações corporativas ou orgânicas adotadas pelo facismo e pelo nazismo; que sobrepujou e venceu ainda a representação Institucional criada pelo Socialismo e pelo Comunismo que, de baixo para cima, criaram as representações sindicais, de fábrica, de escolas e universidades, enfim, que foram para o lixo da história com a queda do império da URSS, da Iugoslávia e com as modificações da China Comunista, que num neo-Gramchismo reinterpretado recriou uma simbiose entre o comunismo e o capitalismo, numa nova versão de shopsue chinês que está sendo aluido paulatinamente pelo processo democrático do mundo virtual e coletivo que paulatinamente vai invadindo e infiltrando sua couraça ideológica e ditatorial levando a uma neo-plastia da forma do futuro para gerir bilhões de chineses revificando os parâmetros colocados no direito por John Locke , em seu Segundo Tratado do Direito Civil em que preleciona a iteratividade entre a área pública e privado e isto é dizer, entre as relações de Igualdade e Liberdade ou Público e Privado na razão e na proporção do número de habitantes, povoação, que pressiona os bens de uma área geográfica atuando sob a lei econômica em que “os meios são escassos e as necessidades são infinitas” tirando daí e nessa razão direta a ilação ou aferimento do direito como conceito de justo adaptado ao momento tecnológico vivido por aquela sociedade sempre imbuído de uma plastia e de uma dinamicidade interativa altamente mutante e evolutiva. John Locke não disse o que disse Pierre Lévy no século XX, sim ele estava no século XVII, mas no entanto exprimiu, com uma premonição incrível, esta mesma fórmula plástica e mutante em outras palavras. Assim é que a forma de democracia grego\romana, altamente estamental ou oriunda e exercida através do status dos pátrias potestas ou patrícios, uma democracia reducionista exercida unicamente por sui juris que alijava mulheres e demais classes sociais deste núcleo de participação e liberdade; conceito este que, com o desabar do Império Romano do Ocidente, perpassa de forma estamental através dos privilégios de estamentos, como nobres, o clero e servos que evoluem, com a urbanização, para a formação da burguesia, para uma construção de sociedade estamental ou de privilégios que constrói o Constitucionalismo através das revoluções burguesas criando e reproduzindo no núcleo duro destes documentos a sua representação classista e plutocrática ou teológica do poder. Esta é a crítica feita por R. Carré de Malberg em sua obra magistral Teoria Geral do Estado que reproduz em largo texto as críticas ao entronamento desta alternativa evolutiva:
Com a palavra Carré de Malberg: [2]
“§ 4. EVOLUÇÃO DOS REGIMES REPRESENTATIVOS DESDE A REVOLUÇÃO.
- A teoria da representação nacional que foi exposta até agora é a que deriva da constituição inicial de 1791(revolução Francesa – grifei) . É a teoria do puro regime representativo, no sentido histórico que a palavra representação obteve sob a Revolução , é dizer, num regime no qual o povo, não podia querer senão através de seus “representantes”, não sendo admitido juridicamente a exercer uma vontade própria, assim é que os seus “representantes” eram órgãos de manifestação de sua vontade, não somente do povo em concreto mas também como também representantes da noção em abstrato de representação nacional ou da Nação; um regime em que a única relação real entre o candidato e o povo é aquela que emanava dos laços que se desprendiam da eleição; um regime que se pode caracterizar ou definir como semelhante ou análogo ao regime de representação que subsidia da mesma forma idêntica ao do monarca ou rei. (Não pela teoria de origem divina do Soberano, mas aquela de origem popular em que o Rei representa o Povo – grifo meu).Resta examinar qual foi na França, depois da Revolução, a sorte ou destino deste regime e deste conceito. Já vimos que a Constituinte, no tempo que assegurava a preponderância da burguesia, tratou de idealizar uma vontade nacional, porquanto a tratou como uma vontade superior aos membros da nação que deveria determina-se por considerações superiores ao interesse geral; neste sentido a Assembléia de deputados estava instituída como órgão da nação. A Constituinte alcançou seu objeto? Os fatos responderam às suas intenções? Não há mais remédio do que reconhecer-se que não. Desde suas origens evolucionárias, o regime representativo sofreu na França consideráveis desvios. Entre os autores que permaneceram apegados as doutrinas representativas de 1791 (Constituição monárquica que ainda mantinha Luis XVI como um títere – grifo meu), Eismein especialmente assinalou estas deformações; “o regime representativo, disse (Duas formas de Governo, revista de direito público, vol. 1, po. 17 ss.), perdeu sua pureza sobre tantos outros, as ideias dos homens da Revolução foram profundamente alteradas, e sob o nome de regime representativo, se pratica atualmente um sistema governamental muito diferente daquele que pretenderam fundar. Esta deformação se produziu sob múltiplas influências…”
Foi Rousseau em seu Contrato Social que estabeleceu com maestria o paradoxo contido na representação burguesa admoestando o regime inglês de representação política da seguinte forma: “O povo inglês pensa ser livre mas o é somente no momento em que coloca o voto na urna; após vive uma ditadura a prazo certo!
O atual regime da Constituição de 1988, mesmo criando mecanismos de participação popular demagógicos e quase inviáveis de participação, como iniciativa de lei, etc, na realidade é um regime elitista e monárquico em que os políticos , como uma casta oligárquica, apossam-se do Estado Nacional e, por gerações, num regime clientelista de quem indica loteiam o Estado Nacional num sistema de patronato ou de padrinhos com seus afilhados indicados para cargos em comissão ou para as prebendas e sinecuras nacionais ocupando, inclusive através desta forma, a cúpula do Judiciário sendo que pela emenda 45, contra o Poder Constituinte Originário, criaram o Conselho Nacional da Magistratura, órgão não previsto pelo Poder Constituinte Originário, fazendo com que o viés político das indicações políticas penetre o Judiciário criando um órgão que salvo melhor juízo, a meu ver, abastarda as garantias de inamovibilidade, irredutibilidade e vitaliciedade da Magistratura, relativizando assim suas garantias e sua independência de prestação jurisdicional. O Regime Constitucional seria idealmente aquele onde o Jurídico cria uma contenção ao Político, que como a agua ou o ar possui uma necessidade ontológica de luta pelo poder, de ocupar todos os espaços e, sem contenção, a contrário sensu, transformaria o poder exercido de forma democrático, a longo ou curto prazo , conforme suas artimanhas, num poder ditatorial civil ilimitado. Assim é que a Lei maior ou a Constituição deveria imitar a frase célebre de Honório Lemes que lutava por leis que governaswsem os homens e não por homens que governassem as leis ou as moldassem ao sabor de seus partidos e do casuísmo vigente em cada momento alternativo de uma república mutante. A constituição de 1988, irmã da constituição de 1946, ambas egressas de ditaduras criaram, para o bem, o controle maior do Congresso Nacional, isto é dizer do Legislativo, sobre o Executivo, dando-lhe a governabilidade e sofreando o mesmo de sua vocação histórica para o exercício discricionário e sem limite de exercício do poder. No entanto, esta alternativa, através do voto de ballottage e da possibilidade de coligações para obter a maioria alvitrada pelo primeiro axioma levaram a criação da legítima fusão do núcleo duro da república instituindo o chamado Governo de Coalisão, maioria que apoia o governo, que se transformou numa ditadura civil que derreteu, em todos estes anos a Constituição e o conceito de controle exercido pela mesma. Pior ainda é que contaminando-se, de forma sistêmica, com a Corrupção, a imoralidade e a desfaçatez aliada a perversão de uma neo-capitalismo, já descrito por John Kenneth Galbraith, em sua obra o Estado Industrial, onde os homens da “mala preta” compram a representação e os políticos colocando o Estado Nacional e suas instituições como verdadeira ficção representativa que deveria espelhar a vontade do Povo Soberano mas na realidade é o covil dos vendilhões da pátria e dos interesses excusos que loteiam e administram o Estado Nacional não em prol do Povo Soberano mas em benefício próprio e das mega empresas que financiam esta avalanche de interesses mesquinhos sobre a coisa pública. Nós temos visto isto aqui no Brasil através de uma posição privilegiada que não cessa na procissão infindável de escândalos públicos que mostram e demonstram a contaminação sistêmica da corrupção como se fosse uma metástase ou carcinoma que apodrece o Estado levando a crise moral e econômica à Sociedade Civil que está sofrendo uma crise imensa agravada por estas relações espúrias.
A partir de 2013, aquele fenômeno que só manifestara-se no Norte da África e na Europa começou a assomar, com características ainda ordeiras, as praças e ruas brasileiras dizendo e repudiando as práticas do estamento político que teima em manter o Povo encerrado num aparato legal, legítimo curral normativo, mangueiras como diz o gaúcho, sujeitando o eleitorado as alternativas pobres e parcas de elementos contaminados, os políticos, oriundos dos mesmos aparatos deformados pela corrupção republicana, pois oligarquias ou verdadeiras quadrilhas se apossam dos quadros partidários, usando de financiamento público, dividindo suas verbas só entre os donos reais do partido, líderes e condutores, que logram os otários que se aventuram idealmente a participar deste jogo de cartas marcadas onde os mais perversos e distorcidos interesses privados se mesclam e aliam para assaltar a Agência de Representação que deveria atuar em nome do Povo Soberano mas atua em deformação atendendo os interesses particulares e dos apaniguados donos do regime neo-capitães hereditários que eternizam os donatários das velhas Capitanias Hereditárias que fundaram esta republica tupiniquim de bananas. QUOSQUE TANDEM CATILINA ABUTERE PATIENTIA NOSTRA!!!
[1] Lévy Pierre – O QUE É O VIRTUAL? – Editora 34 – Coleção Trans – 1997 – São Paulo – fls. 109\110;
[2] Malberg – Carré de – Teoría General del Estado – Facultad de Derecho – México – ano 1998 – fls. 1054 e seguintes.- Primeira Edição 1922 em francês.